segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

FILOSOFIA MODERNA POR MARILENA CHAUI. PARTE X.

2) a geometrização do espaço. Este era, na física aristotélico-tomista, um espaço topológico e topográfico (isto é, constituído por lugares — topoi — que determinavam a forma de um fenômeno natural, sua importância, seu sentido), o mundo estando dividido em hierarquias de perfeição conforme tais lugares. Agora, o espaço se torna neutro, homogêneo, mensurável, calculável, sem hierarquias e sem valores, sem qualidades. É essa a idéia que se exprime na famosa frase de Galileu que abre a modernidade científico-filosófica: "A filosofia está escrita neste vasto livro, constantemente aberto diante de nossos olhos (quero dizer, o universo) e só podemos compreendê-lo se primeiro aprendermos a conhecer a língua, os caracteres nos quais está escrito. Ora, ele está escrito em linguagem matemática e seus caracteres são o triângulo e o círculo e outras figuras geométricas, sem as quais é impossível compreender uma só palavra". Ou como dirá Espinosa, ao escrever sobre os afetos e as paixões em sua Ética, declarando que deles tratará como se estivesse escrevendo sobre linhas, superfícies, volumes e figuras geométricas;
3) a mecânica como nova ciência da Natureza, isto é, a idéia de que todos os fenômenos naturais (as coisas não humanas e humanas) são corpos constituídos por partículas dotadas de grandeza, figura e movimento determinados e que seu conhecimento é o estabelecimento das leis necessárias do movimento e do repouso que conservam ou modificam a grandeza e a figura das coisas por nós percebidas porque conservam ou alteram a grandeza e a figura das partículas. E a idéia de que estas leis são mecânicas, isto é, leis de causa e efeito cujo modelo é o movimento local (o contato direto entre partículas) e o movimento à distância (isto é, a ação e a reação dos corpos pela mediação de outros ou, questão controversa que dividirá os sábios, pela ação do vácuo). Fisiologia, anatomia, medicina, óptica, paixões, idéias, astronomia, física, tudo será tratado segundo esse novo modelo mecânico. E é a perfeita possibilidade de tudo conhecer por essa via que permite a intervenção técnica sobre a natureza física e humana e a construção dos instrumentos, cujo ideal é autônomo e cujo modelo é o relógio.

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