Os pitagóricos, com seu ponto de partida em Crotona, sul da Itália, difundiram-se vastamente. Trata-se da escola filosófica grega mais influenciada exteriormente pelas religiões orientais, e que por isso mais se aproximou das filosofias dogmáticas regidas pela autoridade. O pitagorismo influenciou ao futuro platonismo, ao cristianismo e ainda foi invocado por sociedades secretas que atravessaram o tempo até alcançarem os dias de hoje.
As chamadas doutrinas pitagóricas, nem todas são do mesmo Pitágoras. Os discípulos e historiadores atribuíram-nas ao mestre, quando na verdade se devem ao grupo. Entre outros se destacaram Filolaos, notório matemático e Hicetas, que já ensinava o movimento da terra em torno de seu próprio eixo.
Não sobram escritos de Pitágoras e sim fragmentos de seus discípulos. Destacam-se todavia as informações que vêm de Platão e os comentários de Aristóteles.
Pitágoras (c. 580 a.C. - 500 a. C.) nasceu em Samos, da Ásia Menor. A circunstância de já então estarem integradas no império persa a Ásia grega e o Egito, possibilitou as viagens de Pitágoras por todas aquelas vastas regiões. Desgostoso todavia da ocupação persa, veio, como muitos outros, para o ocidente.
Em Crotona criou uma comunidade ao modo oriental, que veio a ser conhecida como escola pitagórica (ou também escola itálica). Seu grupo dominou politicamente a cidade, como uma espécie de aristocracia. Foi dispersado, ainda em vida de Pitágoras, por uma revolta popular (ou democrática).
Em decorrência os pitagóricos se difundiram amplamente. Árquitas de Tarento fundou uma liga pitagórica (conhecida como liga pitagórica recente), que era a do tempo em que Platão visitou a Itália. Mais tarde ainda haverá os neopitagóricos.
A comunidade pitagórica apresenta aspectos inovadores para o Ocidente. Hoje há quem fale em analogias com a sociedade maçônica. Esta, na busca de remotas origens, refere-se também aos pitagóricos. Todas as modalidades religiosas do Ocidente resultam, em última instância, do evolver transformante de formas orientais. As futuras ordens religiosas cristãs também virão do Oriente. Seria, porém, Pitágoras o primeiro a fazer uma tal transposição para o Ocidente.
Filolaos. Citam-se pelo nome numerosos pitagóricos, sendo que o mais destacado foi Filolaos, ao qual sobretudo se atribui o desenvolvimento da doutrina sobre os números como arquétipos. Pelos anos 410 a.C., Filolaos se encontra em Tebas, conforme referência de Platão, havendo retornado por último à Itália. Ali Platão adquiriu sua obra Sobre a natureza.
Outros pitagóricos citam-se as dezenas, dos quais a maioria é conhecida apenas pelo nome:
- Lisis, discípulo direto de Pitágoras e mestre de Filolaos; - Hipasus, também da fase inicial; - Hicetas, que ensinou o movimento da terra, em torno de seu próprio eixo; - Alcmeon de Crotona; - Árquitas, fundador de uma influente liga pitagórica; - Clínias; - Cebes.
As doutrinas pitagóricas são inteletualistas, espiritualistas, metafísicas, ao mesmo tempo que vêem no universo um corpo ígneo, situado no centro, girando em torno do seu próprio eixo.
O saber é considerado elemento de perfeição. Dali a tendência da escola, de transferir as preocupações ascéticas para a do estudo. Progrediram consequentemente as ciências, como da filosofia, da matemática, da astronomia. O mesmo transformismo ocorreria de futuro em alguns setores das ordens cristãs, todavia muito mais vagarosamente, enquanto outros mantinham a perfeição apenas na rigidez das práticas ascéticas de purificação.
Os métodos pedagógicos do aprendizado são passivos, com exaltação do mestre. O silêncio era imposto 5 anos aos discípulos, sendo depois facultado dialogar com o mestre. É possível tratar-se de um reflexo das convicções orientais da "inspiração" das grandes doutrinas e que por isso dariam ao mestre uma posição excepcional; o mesmo se dará com o dogmatismo cristão.
Mantinha-se segredo das doutrinas dentro do grupo; outros negam ter havido segredo doutrinário, mas apenas o das questões de comunidade.
A mundivisão pitagórica é dualista. Todas as coisas se compõem de elementos contrários: limitado - ilimitado; par - ímpar; unidade - pluralidade; direito -esquerdo; macho - fêmea; repouso - movimento; reto - curvo; luz - escuridão; bem -mal; quadrado - oblongo.
É significativa a advertência para o caráter binarista da natureza e do ser em geral, aspecto que modernamente será explorado por alguns filósofos.
Dentre estas oposições advertidas pelos pitagóricos é significativa a oposição entre bem e mal, porque sobretudo este dualismo orienta a mundivisão pitagórica. Este dualismo do bem e do mal, bem como o dualismo irredutível matéria e espírito, não é original no mesmo pitagorismo, porquanto já era advertido nas práticas do dualismo da religião persa, de onde a recebeu Orfeu (e dali orfismo).
A matéria é má e o espírito é bom. Não podem misturar-se, senão por castigo, em vista da dor que a matéria provoca ao espírito. Mas o sofrimento é purificador. Dali resulta a doutrina geral do pitagorismo: os espíritos vêm de fora, para cumprirem penalidade em função a alguma delito cometido, do qual se purificam no sofrimento. Finalmente retornam ao mundo exterior ou seja ao céu. Repetem-se as reencarnações até completar a purificação. Tal doutrina, que se funda em equívocos psicológicos, se repete através dos tempos, tanto na filosofia, especialmente na de Platão, como na religião, quase sempre nas tradicionais. A doutrina dos números, interpretada como arquétipos, é peculiar aos pitagóricos, e deve ser de uma fase posterior à Pitágoras, criada por seus discípulos. A realidade total é composta de matéria e números; estes são como que paradigmas, que dão forma às coisas. Não se entendem apenas no sentido aritmético, mas também como formas geométricas, harmonia e ordem.
Encontra-se também aqui em embrião, tal como já em Anaximandro, a teoria do hilemorfismo (hilematéria e formé = forma), de Platão e Aristóteles. Em Platão os paradigmas ou arquétipos, em vez de números, são idéias reais; situadas num mundo exterior, servem de modelos arquétipos às formas que o Demiurgo aplica à matéria. Tais influências as teria tido Platão ao visitar os pitagóricos na Itália, como ainda pela presença dos mesmos na Grécia continental.
De outra parte, não se sabe ao certo o sentido que os pitagóricos davam aos seus números. Não era seguramente na acepção gráfica (na época escritos com letras). Os números são concebidos como unidades, linhas, formas.
Todavia neste plano há duas maneiras de conceituar os números pitagóricos. A interpretação paradigmática é a de que cada unidade concreta teria a sua unidade arquétipa exterior; este é o sentido que também possuem as idéias reais de Platão, que simplesmente teria substituído a noção dimensional de número pela idéia exemplar em geral. A outra interpretação seria a não paradigmática; os números seriam as unidades concretas, combinadas diretamente com a matéria; não haveria a dualidade entre o número paradigma e o número concretizado.
É insegura a versão que atribui a Pitágoras a autoria do nome de filósofo, para não denominar-se sofós ( = sábio). O fragmento 35 de Heráclito é uma versão mais antiga (Os homens amantes da sabedoria = philosophus).
Igualmente antiga é a narrativa de Heródoto (Hist. I, 30) que introduz o nome no diálogo havido entre Creso e Solon; dizia o rei ao sábio - "ouvi que percorreste muitos países como filósofo = hòs philosopheon".
A atribuição a Pitágoras veio através de Heráclides Pôntico (cujo texto já está perdido e que foi citado por Cícero e Diógenes Laércio. De Cícero: "Todos os que se dedicavam ao estudo pela contemplação das coisas, eram tidos e nomeados sábios (= sofói); e este nome deles se manteve até a época de Pitágoras, o qual interrogado pelo príncipe Leonte com o qual dissertara doutamente e copiosamente, em que principalmente se apoiava, respondeu: que nenhuma arte ele sabia; mas que era filósofo ou amante da sabedoria ou estudioso" (Cicero., Tusculanae disputationes, L.5, c.3 § 8-9).
As informações de Heráclides, amigo dos pitagóricos, pertencem ao círculo platônico do tempo de Aristóteles. Poderão ser vagas atribuições ao antigo mestre Pitágoras, sem que efetivamente tenha criado o nome de filósofo, poderá tê-lo usado de preferência ao de sábio, como também sucedera a Creso, Sólon, Heráclito, Heródoto. Ainda hoje, os estudiosos não se denominam a si mesmos de sábios, mas antes de filósofos e cientistas.
Fonte: Fonte: Enciclopédia Simpozio
http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/novo/2216y013.htm#BM2216y018
Nenhum comentário:
Postar um comentário