A autora com seus pais. |
Minha mãe ao ser surpreendida por mim, levando mingauzinho na
bolsa para a irmã que estava hospitalizada se justificou:
“Minha filha aprendi com seu avô que os médicos só sabem o quem
tem nos livros, e nos livros não tem amor, explicou-me ela, pacientemente.”
Veja bem - continuou- quando sua irmã era criança, lá na roça,
ela ficou muito doente. Um dia o médico foi lá. Antes de ir embora me
chamou num canto e me disse baixinho: “olha aqui, dona, sua filha quase não tem
água no corpo, a senhora vai fazer um chá preto e dar a ela de cinco em cinco
minutos, senão ela vai morrer, porque está muito fraca. Ela tem que beber
bastante água ou chá preto. Mas tem que ser de pouquinho em pouquinho,
entendeu? ”.
- Sim, respondi. Na mesma hora eu fui pra cozinha, fiz o chá e
levei pra ela. Mas cadê que ela bebia? Cuspia tudo e chorava fraquinha, pois
não tinha mais força nem para abrir a boca. Comecei a ficar mais angustiada.
Eu rezava e pedia a Nossa Senhora - que é a mãe dos pobres - que
cuidasse de minha filha e não levasse ela embora, porque eu tinha muitas filhas,
gostava demais de todas, mas gostava mais daquela porque estava doentinha. Que
ela me perdoasse a preferência, mas quando ela curasse a minha filha eu
voltaria a gostar de todas do mesmo jeito.
Eu acabei de rezar, peguei sua irmã no colo e ficamos bem
abraçadinhas. Eu queria cantar uma musiquinha pra ela, mas não conseguia, só
tinha vontade de chorar, chorar, chorar e chorar...
Seu pai, meio desesperado tinha saído pra refrescar a cabeça.
Vocês eram muito pequenas. Naquela hora, era eu, o menino Jesus e Nossa
Senhora. Só que eu estava tão desesperada que nem lembrava que eles estavam
comigo.
Nessa hora, minha filha, seu avó chegou lá em casa e me viu
naquele desespero. Não pensou duas vezes. Foi pra cozinha, pegou um pouco de
fubá, molhou, fez uma bola, enrolou num pano e botou esta bola de fubá enrolado
no pano, na água fervendo com um pouquinho de sal e açúcar e deixou no fogo por
meia hora. Depois tirou a bola da panela, esfriou aquela aguinha de fubá, levou
até o quarto onde eu estava chorando agarrada à sua irmã e me disse:
- “ Sua filha não vai morrer. Os médicos só sabem o que tem nos
livros e nos livros não tem amor. Não sabem nada de vida. Chá preto é pra velho.
Criança gosta de coisa boa, docinha. Dê esta água de fubá a ela de cinco em
cinco minutos. Fique forte e cante uma canção de ninar pra ela dormir e não
gastar as forças. Procure os brinquedos que ela gosta e coloque perto do
bercinho. Mostre a ela o passarinho na janela. Amanhã ela vai estar melhor. Eu
vou agora, mas amanhã sua mãe vem pra ficar com você, ajudando a cuidar das
crianças. Sossegue o coração e confie em Deus.”
Olhe minha filha, você pode nem acreditar em mim, mas aconteceu
exatamente como meu pai falou. Sua irmã, aos poucos, foi ficando fortezinha, e,
com uma semana já estava brincando com vocês, bem alegre. Foi aí que entendi
que os livros não ensinam todas as coisas. Agora, você quer saber mais ?!! Eu vou levar, sim,
o mingau para a sua tia. Se você quiser, pegue o carro e vá ao hospital me
denunciar, mas a culpa não será minha se ela morrer – ameaçou-me a poderosa e
maravilhosa mãezinha, analfabeta de pai e mãe, não no sentido figurado, mas na dura
realidade.
Não. Eu não a denunciei se querem saber. Embora na qualidade de
profissional da saúde eu reconheça a necessidade de se estabelecer certos
parâmetros na conduta hospitalar, não tive coragem de tomar-lhe a garrafinha
com o milagroso mingau e muito menos falar com ela sobre a medicina e suas competências.
No entanto, confesso que fiquei muito feliz quando o telefone, dias depois, tocou
avisando que minha tia estava, novamente, em casa.
É, mãezinha, o amor de fato precede o saber e, juntos, fazem
milagres!
Tilly
Um comentário:
Muito linda a história toda. Vejo que o amor e medidina fazem milagres. Nós familiares e pacientes em estado crítico ficamos impotentes não odemos fazr quase nada além de estra presente e dar o nosso amor. Eu dizia muito ao meu marido que eu sofria mais por vê-lo impotente diante de meu sofrimento do que com a doença em si. Sim o mingau faz a diferença.
atxba@hotmail.com
Márcia Chaves
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