CARTA A VILMA
Vera Freitas
Querida amiga-irmã,
Você está certa:
Eu só escrevo por tristeza,
Paixão, insônia ou dor.
Se nada estiver moendo minha alma
Revolvendo meus sentidos
Me tirando o sono e a fome
O lápis fica imóvel
E o papel e branco me contempla
Com irônico, desafiador.
(Não sou poeta de computador.)
A alegria não faz com que eu transborde
(nem mesmo de pileque),
Expondo meus avessos, meus escuros,
Mostrando meus remendos descosidos
À luz crua do dia.
A alegria eu apenas sinto.
Passageira,
Ela desliza sobre mim, ligeira,
Me luminando por um momento lindo
E foge na carreira.
Minha tristeza fica.
É constante, é fiel, é permanente.
Sua presença se impõe de tal maniera
Que eu tenho de escrever para suporta
E até para acreditar que ela existe
Assim tão desalmada, tão perene,
Assim tão exigente...
Só escrevendo posso amortece
Os tombos que eu levo na corrida.
Porque sentir somente
É impossível
Não dá pra aguentar...
Por isso, receba meu abraço amigo,
Perdoe o tom lilás dos meus escritos
E esse gostinho amargo que eles tem.
Como é que poderia adivinhar
Que um dia iam ser lidos por alguém?
(Para Vilma Pinto)
No quintal de um sobrado
Tinha um pé de fruta-pão
Que a chorar manava leite
Se ferido por facão.
Só que a cada golpe sentido,
Decorrente do desgosto,
Do âmago da cicatriz
Surgia mais novo broto.
Novo broto hei de ser
Do golpe que me atingiu.
Hei de novo esgalhar,
Reflorir, frutificar!
Nova sombra ha de ter
Quem vive pra o bem querer.
A viagem
Mônica M. Klein
Quem é que está aqui, neste corpo presente?
É tanta carne, tanto osso, tanta pele...
Não há espaço para nada, por mais que se apele
Não há espaço para nada, neste corpo presente.
Falta tato, falta oco, falta o tudo
Que lá fora tudo envolve e me reclama
Qual a graça de caber no próprio drama
Se no fim o corpo todo fica mudo?
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