A teoria do ato e potência, que é uma inovação de Aristóteles, divide o ser em dois príncipios constitutivos intrinsecos. Ela busca explicar as transformações, o movimento e a ação das faculdades do conhecimento e da vontade. Por mais diversos que sejam os atos e mais diversas as potências, o binômio se opõe entre si, compondo os entes. Diz-se ato, o ser enquanto já é. De algum modo, significa determinação e perfeição. A principal determinação é a da existência; é a determinação na ordem do ente; o ser que existe está pois em ato. A determinação se dá também na ordem da essência, enquanto esta apresenta esta ou aquela fisionomia.
Potência é aquilo que ainda não é, mas preexiste realmente como possibilidade de vir a ser.
"Das coisas não existentes, algumas existem em potência, por não existirem em ato" (Metaf. 1047b 1).
A semente é um exemplo de ser parcialmente em ato, estando o mais em potência.
Há potências ativas e passivas. As potências passivas apenas recebem o ato. As ativas têm a potência de produzir o ato.
O homem têm potências, como as do conhecimento e as dos impulsos. Seuexercício obedece às regras fundamentais da doutrina do ato e potência.
Deus.
Aristóteles não estabelece Deus como criador do mundo, o qual é eterno, mas como causa ordenadora do mesmo, principalmente como seu primeiro motor. Uma vez que o mundo é eterno e Deus somente comparece como um peça motora, a divindade de Aristóteles não assume o caráter pomposo que ela usa ter nas religiões. Não obstante, o Deus de Aristóteles tem muito mais coerência interna e foi concebido como pensamento de pensamento.
Em Platão a preocupação dominantemente é a de Deus como forma exemplar, ainda que fosse através das idéias arquétipas. O Demiurgo e a alma do mundo (que em Platão também se identificam com a divindade) são ativos; mas não explicam esta atividade.
Aristóteles advertiu:
"Nada nos adianta supor substâncias eternas, como fazem os que acreditam nas formas, a não ser que nelas haja um princípio capaz de produzir mudança. E nem mesmo isso basta, como tão pouco será suficiente uma outra substância além da formas, pois se ela não for capaz de agir, não haverá movimento. Digo mais: ainda que ela aja, isso não bastará, se a sua essência for apenas potência; não haverá movimento eterno, porquanto o que é em potência pode não ser. Deve, por conseguinte, haver um tal princípio, cuja própria essência seja a atualidade. Por outra parte, estas substâncias devem ser imateriais, pois se há algo de eterno hão de ser elas. Sua essência é, por conseguinte, o próprio ato" (Metaf. 1071b 16-23).
O movimento não existe, todavia, no primeiro motor, o qual move sem se mover ele mesmo.
"Como o que move e é movido é intermediário, existe algo que move sem ser movido e que é eterno, uma substância e uma atualidade" (Metaf. 1072a 25).
Exemplificando com analogias, Aristóteles tenta esclarecer o que seria um motor imóvel.
"Tal é o movimento do desejável e do inteligível: movem sem ser movidos. Os objetos primeiros do desejo e do pensamento são os mesmos, pois o bem aparente é o objeto do apetite e o bem real é o objeto primeiro do desejo racional. Mas desejamos uma coisa porque nos parece boa, e não nos parece tal porque a desejamos: o pensamento é o ponto de partida. Ora, o pensamento é movido pelo inteligível" (Metaf. 1072a 26-30).
Frisando a perfeição divina, funde em Deus o pensar e o objeto do pensar, de sorte que ele fica sendo pensamento de pensamento, como um só ato, sem composição.
Desta maneira continua em Aristóteles o mérito dos gregos de haverem instituído, por primeiro, uma noção de Deus purificada dos tradicionais antropomorfismos. Em consequência chegou Aristóteles a definir a Deus como pensamento de seu mesmo pensamento, porque ele mesmo é o mais digno de ser pensado por Deus.
"A natureza do pensamento divino suscita certos problemas. Com efeito, o pensamento parece ser a mais divina das coisas que conhecemos; mas, para sê-lo efetivamente, como deve ele exercer-se? Isto apresenta dificuldades. Se não pensa em nada, onde está a sua dignidade? Seria como um homem que dormisse.
E se pensa, mas isso depende de outra coisa, não pode ser a melhor substância, uma vez que essa substância não seria então o próprio pensamento, mas uma simples faculdade de pensar; pois é o ato de pensar que lhe confere o seu valor. Além disso, quer seja faculdade, quer ato, que pensa ele? Porque, ou pensa a si mesmo, ou algum outro objeto. E, se pensa outro objeto, ou este é sempre o mesmo, ou varia. Mas tem ou não importância que o objeto do pensamento seja ele próprio ou uma coisa qualquer? Não seria absurdo que pensasse em certas coisas?
É evidente, pois, que pensa no que há de mais divino e excelente e que nunca muda, porquanto mudar seria passar do melhor ao pior e seria já um movimento. Donde se conclui que se o pensamento não é o ato de pensar, mas uma potência, é provável que o exercício constante dessa faculdade fosse para ele uma fadiga; e haveria evidentemente, algo mais valioso que ele , o objeto pensado. Pois tanto o pensamento como o ato de pensar pertencerão inclusive ao que pensa a coisa mais desprezível do mundo, de forma que, se isso se deve evitar (e deve), pois existem até certas coisas que é preferível não ver a vê-las, o ato de pensar não pode ser o que há de mais excelente.
Logo, é a si mesmo que o pensamento divino pensa (já que é ele a mais excelente das coisas) e o seu pensar é um pensamento de pensamento" (Metaf. 1074b 15-35).